quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Aqualtune: Princesa no Congo, mas escrava no Brasil - Poesia de Cordel

AQUALTUNE
por Jarid Arraes
Aqualtune era africana
Era princesa importante
Rei do Congo era seu pai
Homem mui preponderante
E por isso era criada
Como parte bem reinante.
Lá no Congo era princesa
Pois vivia tal e qual
Mas haviam outros reinos
Dos quais Congo era rival
E por isso houve guerra
Com desfecho vendaval.
Na disputa dessa guerra
O seu pai foi derrotado
E vendidos como escravos
Foi seu reino humilhado
Mais de dez mil lutadores
Também foram enjaulados.
Aqualtune foi vendida
Em escrava transformada
Foi levada para um porto
Onde foi então trocada
Por moeda, por dinheiro
Pruma vida aprisionada.
Parou num navio negreiro
Que ao Brasil foi viajar
Nos porões do sofrimento
Muito teve que enfrentar
Pois não era ele cruzeiro
Que alguém fosse desejar.
Aqualtune com seu povo
Nos porões muito sofreu
Tinham febres e doenças
Pela dor que só cresceu
Era fome e era castigo
Muita gente padeceu.
Foi no Porto de Recife
Que o navio ali parou
Quando muito finalmente
No Brasil então chegou
Aqualtune novamente
Teve alguém que a comprou.
Foi vendida como escrava
Chamada reprodutora
Imagine o pesadelo
Que função mais redutora
Pois seria estuprada
De escravos genitora.
Sua principal função
Seria a de procriar
Estuprada na rotina
Muita dor pra suportar
Imagine uma princesa
Isso tudo enfrentar!
Foi levada a Porto Calvo
Pernambuco, a região
E vivendo como escrava
Enfrentou a solidão
Os castigos e torturas
Do seu corpo a agressão.
Imagine quantos filhos
Aqualtune teve então
Tudo fruto de estupro
Fruto de violação
E ainda eram tomados
No meio dum sopetão.
Mas na vida de tortura
Aqualtune ouviu falar
Sobre a pura resistência
Dos escravos a lutar
E ouviu sobre Palmares
O que pode admirar.
Aqualtune se empolgou
Do seu povo quis a luta
E pensou em se juntar
Pra somar nessa labuta
Mesmo estando em gravidez
Ela estava resoluta.
A gravidez já avançada
Não causou impedimento
Aqualtune foi com tudo
Formando esse movimento
De convicta esperança
E com muito entendimento.
Junto com outras pessoas
Negras de muita coragem
Aqualtune fez a fuga
Mesmo com toda voragem
Foi parar em um quilombo
E falou de sua linhagem.
Todos lá reconheceram
Que era ela uma princesa
E por isso concederam
Território e realeza
Para a brava Aqualtune
Bem dotada de certeza.
Nos quilombos do Brasil
Era forte a tradição
De manter vivas raízes
Africanas na nação
Aqualtune isso queria
Disso fazia questão.
Mas a sua importância
Muito mais se mostraria
Não se sabe com certeza
Mas pelo que se anuncia
Aqualtune teve um filho
E Ganga Zumba ele seria.
Segundo essa tradição
Foi avó doutro guerreiro
De imensa relevância
Para o negro brasileiro
Era Zumbi dos Palmares
Liderança por inteiro.
Aqualtune, infelizmente
Faleceu numa armação
Planejada por paulistas
Com fim de destruição
Do quilombo de Palmares
E de sua tradição.
Sua aldeia foi queimada
Pelos brancos assassinos
Não se sabe bem a data
Do seu fim e desatino
Mas a sua história viva
Para isso a descortino.
Quando ela faleceu
Bem idosa já estava
Aqualtune sim viveu
Como líder destacada
Essa força feminina
Que a princesa exaltava.
Eu só acho um absurdo
Porque nunca ouvi falar
Na escola ou na tevê
Nunca vi ninguém contar
A história de Aqualtune
E o que pode conquistar.
Uma história como a dela
Deveria ser contada
Em todo livro escolar
Deveria ser lembrada
No teatro e no cinema
Que ela fosse retratada.
Mas eu tive que sozinha
Sua história então buscar
Foi porque ouvi seu nome
Uma amiga então citar
E por curiosidade
Na internet procurar.
É por isso que eu escrevo
E o cordel quero espalhar
Pra que mais gente conheça
E também possa contar
Tudo que Aqualtune fez
Pois é tudo de inspirar.
A história do meu povo
Nordestino negro forte
É tão rica e importante
É vitória sobre a morte
Pois ainda do passado
Modificam nossa sorte.
Quando penso em Aqualtune
Sinto esse encorajamento
A vontade de enfrentar
De mudar neste momento
Tudo aquilo que é racismo
E plantar conhecimento.

 FIM

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